Cadê a Loba??? Desde 1977 o povo de Belo Horizonte e da Lagoinha procuram a escultura da Loba que simboliza o mito da criação da cidade de Roma.
Para entender essa pergunta é preciso saber a história desse imóvel que foi encomendado a Octaviano Lapertosa por João Abramo. A construção contempla 4 (quatro) dormitórios, sala de visitas, sala de jantar, copa, cozinha e banheiro, uma varanda lateral usada para entrada e circulação.
No projeto de palacete, em estilo neoclássico italiano, a platibanda ostentaria uma águia romana que era um símbolo da Roma Antiga, sendo usada pelo exército romano como insígnia das legiões romanas. Geralmente feita em ouro ficava sob a custódia da soldados e saia do acampamento em raras ocasiões. Para garantir a sua segurança havia um suboficial legionário, denominado aquilífero, que em ocasião de batalha deveria defender a insígnia a qualquer custo, mesmo o da própria vida, pois era sinal de grandes desgraças a sua perda.
O projeto foi aprovado em 31 de janeiro de 1924 e recebeu o nº 23 pela Prefeitura de Belo Horizonte. Por um acaso do destino, provavelmente durante a execução da construção, a águia foi substituída pela Loba, também denominada Loba Capitolina, que é um símbolo que representa as narrativas sobre a fundação da cidade de Roma. Com a alteração foram colocadas duas águias no portão de entrada do imóvel.
Segundo a mitologia romana, dois irmãos gêmeos, um dos quais, Rômulo, foi o fundador da cidade de Roma e seu primeiro rei. Segundo a lenda, eram filhos de Marte (deus romano da guerra) e de Reia Sílvia, filha do rei e herói troiano Eneias. Reia era uma sacerdotisa vestal, dedicada à deusa Vesta e por isso deveria se manter casta. O irmão de Eneias, Amúlio, descobriu a verdade sobre os gêmeos, prendeu Reia e ordenou que seus filhos fossem jogados no rio Tibre. Como um milagre, o cesto onde estavam as crianças acabou atolando numa das margens do rio no sopé do monte Palatino onde foram encontrados por uma loba que os amamentou.
Tempos depois, um pastor de ovelhas chamado Fáustulo encontrou os meninos próximo da Figueira Ruminal, na entrada de uma caverna chamada Lupercal. Ele os recolheu e os levou para sua casa onde foram criados por sua mulher Aca Larência.
Anos depois, Fáustulo revelou a verdade a Rômulo que partiu para a cidade onde matou Amúlio e libertou seu avô e sua mãe. Os gêmeos decidiram então partir da cidade juntos com todos os indesejáveis para fundarem uma nova cidade no local onde haviam sido deixados. Rômulo queria chamá-la Roma e edificá-la no Palatino, enquanto Remo desejava nomeá-la Remora e fundá-la sobre o Aventino. No meio das discussões subsequentes, Rômulo matou seu irmão e fundou sua cidade, Roma. A data de fundação de Roma é indicada, por tradição, em 21 de abril de 753 a.C., também chamado de "Natal de Roma".
O senhor João Abramo era rico comerciante e edificou um luxuoso palacete, rico em materiais importados, como tributo a sua origem italiana. O imóvel foi construído da com materiais importados, mármore Carrara, lustres europeus, portões e grades de ferro decoradas. Trouxe um escultor da Itália para fazer a Loba e as Águias romanas. O interior foi pintado com afrescos de um artista também trazido da Itália que retratavam paisagem de sua terra natal.
O senhor Abramo teve problemas financeiros e vendeu os imóveis na Rua Itapecerica nº 579 e nº 595/603 com seu amigo Felício Rocho que também era padrinho dos seus filhos. Quando se restabeleceu tentou reaver os imóveis do senhor Felício Rocho não teve interesse no negócio.
A família Abramo morou por algum tempo na Rua Resende Costa, mas deixou a região nos anos 1980.
Conforme Plínio Barreto, a Casa da Loba foi sede do Guarani football club, que foi conhecido como o “alvi-negro-indígena” da Lagoinha e dividia a atenção dos moradores com uma rivalidade que provocava conflitos generalizados entre as torcidas nas décadas de 1920 e de 1930. Mais tarde surgiram os clubes Terrestre, Brasil e Vera Cruz, que também eram prolongamento dos lares lacustres.
Os clubes Guarani e Fluminense disputavam campeonatos enfrentando os grandes Atlético, Palestra (hoje Cruzeiro), América e Vila Nova. O Guarani orgulhava-se em ostentar a melhor entre as sedes sociais existentes em Belo Horizonte. Nessa época era a casa mais badalada do bairro, tendo em vista os bailes e festas promovidos pelo Guarani.
Todos os clubes da Lagoinha foram condenados com o advento do profissionalismo do futebol e a chegada das máquinas rasgando a primeira Avenida, chamada de Dom Pedro Primeiro, depois Pampulha e hoje Presidente Antônio Carlos, desaparecia o campo e, com ele, os times e o futebol na Lagoinha. O campo de terra batida que um dia existiu estaria localizado na Avenida Presidente Antônio Carlos nº 561, hoje SENAI Américo Renê Giannetti. O edifício do SENAI está localizado em linha reta à Casa da Loba e está indicado para tombamento pelo CDPCMBH.
Ela é o vulto de um dos primores da arquitetura neoclássica que Belo Horizonte testemunhou, e está rodeada de mitos que dividem a população. Para alguns foi lugar de residência de importantes famílias, para outros serviu de lugar para o comércio do amor. A edificação integra um conjunto com outros 3 (três) sobrados contíguos (nº 595/605, nº 613 e o nº 625/633), que também possuem grande área arborizada ao fundo dos lotes.
Em 1976, o Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (IEPHA/MG) realizou o tombamento provisório edifício do localizado à Rua Itapecerica, 579, denominada Casa da Loba. O parecer técnico apresenta uma análise sucinta sobre a edificação, contudo sem profundo embasamento histórico, artístico e arquitetônico. A opinião é acompanhada de extenso registro fotográfico que não consegue suprir a ausência de tais elementos.
Segundo as informações presentes no parecer, a edificação apresenta uma mescla de influências arquitetônicas de origem italiana, tornando o referido bem eclético em sua arquitetura. Entretanto, os estilos e artistas responsáveis por tal junção de estilos não são apresentados no texto, empobrecendo a riqueza de elementos que justifiquem seu tombamento.
Diante a falta de elementos que justificassem o tombamento, a então proprietária do imóvel, Imaculada Rosso Iannoni Carneiro, impugnou o tombamento provisório com base na interpretação literal do Decreto-lei nº 25 de 1937. Justificando em síntese a ausência de elementos fundamentais para a efetivação do tombamento em uma análise concisa e bem estruturada. Defendeu que falta ao imóvel estilo arquitetônico concreto, anteriormente destacado pelo técnico responsável pela elaboração do parecer do IEPHA, valorizando a relevância arquitetônica, mas afirmando que a mesma não possuía qualquer tipo de marco histórico e monumentalidade que justificasse o tombamento. Por fim, a proprietária relembrou a participação de sua família na cessão de terrenos e imóveis para a Prefeitura de Belo Horizonte, incluindo a Fundação Felício Rocho e o Hotel Avenida, esclarecendo que após tantas doações, a referida residência era tudo o que havia restado para ela.
Após o pedido de impugnação do processo, uma nova análise foi realizada e, corroborando com o posicionamento da proprietária, a conselheira do Patrimônio Municipal, Ismailia de Moura Nunes, emitiu um parecer solicitando o acolhimento do recurso. Em síntese defendeu que o imóvel não possui nenhum tipo de atrativo ou justificativa para seu tombamento, respaldando-se nos professores Ivo Porto Menezes e Luciano Amedée Peret ao afirmar que a arquitetura é de uma fase não áurea. Além de que a edificação mistura estilos destacando a art nouveau e as influências góticas de forma “medíocre” e “grosseira”.
A análise técnica do parecer poderia denota um posicionamento pessoal da conselheira, tanto pelo imóvel quanto pela região Lagoinha em si, a qual a mesma se refere como uma região indigna de um reconhecimento tão valioso. Contudo, as falhas técnicas presentes no referido dossiê podem ser justificadas pela ausência de uma orientação legislativa constitucional, uma vez que tais tipos de direcionamento foram outorgados apenas em 1988, onze anos depois da elaboração do dossiê. Bem como, para o fato de ser um dos primeiros processos realizados pelo IEPHA que não possuía uma política patrimonial robusta.
Em 1977, após o cancelamento do tombamento a então proprietária protocolou projeto de modificação da fachada da Casa da Loba. Atualmente é possível observar a completa desfiguração do imóvel. Ele está revestido de reboco de argamassa, não apresenta pintura e mantém os portões de ferro. As Janelas em madeira de verga reta apresentam-se preservadas, mas as duas janelas centrais de verga em arco pleno foram substituídas. Todos elementos em massa originais foram retirados, inclusive cornija, platibanda, incluindo a loba que encimava o conjunto. O dossel da cobertura na varanda lateral de acesso também foi retirado. A valorização original dos planos pelos ornatos em massa, e a antiga cobertura da varanda davam outro aspecto à volumetria da edificação.
Atualmente o imóvel é ocupado por uma família, que impede o acesso de qualquer pessoa ao interior do imóvel. A localização das esculturas da Loba e das Águias permanecem um mistério. A Casa da Loba é lembrada como um espaço que despertava e desperta interesses e admiração por sua beleza arquitetônica e se tornou de certo modo um dos símbolos ou um ícone da região da Lagoinha.